O problema de qual seria relação entre a mente e o corpo tem ocupado um lugar proeminente na história do pensamento filosófico e científico. Tanto é assim que uma miríade de soluções foi proposta. Porém, a maioria delas pode se enquadrar nos eixos monismo/dualismo e idealismo/materialismo. Uma posição monista é aquela que reconhece a existência de um tipo de substância só, enquanto a dualista postula a existência de duas, uma material e outra “espiritual”. A postura idealista, representada por Platão, por exemplo, propõe que só gozariam de existência real as “idéias” e não o mundo sensível, mera cópia imperfeita delas. A postura materialista já tem a visão oposta: só o mundo sensível deve ser considerado como existente. Outros posicionamentos são difíceis de encaixar nessas categorias, como o caso da filosofia escolástica, que considera o homem como uma substância só; mas constituída a partir de dois coprincipios de diferente natureza: a matéria e a forma. No entanto, devido às suas características (seu fundamento na observação, por exemplo) a ciência tem se decantado, em geral, por uma posição abertamente monista e materialista.
Na tentativa de harmonizar posições netamente científicas com a constatação da existência de experiências subjetivas, tem surgido explicações de tipo emergentista. Esse tipo de argumentação se baseia na idéia de que propriedades novas podem “emergir” em organismos com um maior nível de complexidade. Da mesma forma que a água tem propriedades que não se encontram no oxigênio e no hidrogênio por separado, o cérebro humano seria capaz de produzir capacidades ou funções que não se encontram em cérebros de animais com níveis inferiores de complexidade. Porém, a hipótese emergentista não explica satisfatoriamente como isso aconteceria. Precisamente o “como” se dá esta interelação entre o físico e o mental é o que Chalmers chamou o problema “difícil”. O problema “fácil” –a correspondência entre processos físicos no cérebro e processos subjetivos- está sendo resolvido de forma lenta, mas adequada, pela neurociência atual.
Mark Solms e Oliver Turnbull, destacados neuropsicanalistas, propõem uma nova perspectiva sobre o assunto que daria conta de explicar tanto o problema fácil como o problema difícil: o Monismo de aspecto dual. Nesta perspectiva, existiria só um tipo de substância, que pode ser percebida sob dois aspectos: como matéria/ cérebro (quando olhamos o cérebro enquanto estrutura anatômica) e como experiência subjetiva (através da introspecção). Porém, como só podemos ver essa substância subjacente ora através de um desses prismas, ora através do outro, nunca poderemos ter certeza de como ela é em si. Desta forma, ficaria resolvido o problema da interação entre mente e corpo; pois não existiriam, em verdade, duas substâncias de diferente natureza; mas uma substância só, percebida de duas formas diferentes. O problema da relação mente/corpo deixaria de ter, então caráter ontológico, e passaria a ser um problema apenas de percepção, embora irresolúvel.
Jaume Aran
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